Por Alan R. Oliveira
23 de Abril de 2025
É muito comum, principalmente entre os Brasileiros, entre a maioria das pessoas que tenho tido contato durante minha vida, uma maneira de pensar um tanto caótica e ilógica. Com frequência, vejo pessoas chegando a conclusões exageradas ou sem sentido a partir de premissas que, na verdade, não sustentam esse tipo de dedução.
Há muitos que defendem ideias com conclusões equivocas tiradas de acontecimentos do dia a dia que nem sempre é por má fé, mas sim por dificuldade de pensar da maneira correta, dificuldade de interpretar e processar corretamente informações que recebemos através dos nossos sentidos.
Sabendo o básico de silogismo você conseguirá pensar melhor, tirar melhores conclusões dadas as premissas. Desenvolver a habilidade de avaliar tanto os argumentos que nos são apresentados quanto as ideias que nós mesmos formulamos.
Mas afinal, o que é silogismo?
O Silogismo, que tem origem na palavra grega syllogismos ( 'conexão de ideias', 'raciocínio',), é uma forma de raciocínio baseada na dedução. Na forma clássica é um argumento dedutivo constituído de três proposições declarativas (duas premissas e uma conclusão) que se conectam de tal modo que, a partir das duas primeiras (as premissas), é possível deduzir uma conclusão. A teoria do silogismo foi exposta por Aristóteles nos Analíticos anteriores. [1]
Utiliza-se de 3 termos, o termo menor, médio e maior para a elaboração do silogismo. Mas o que é proposição, o que é uma premissa e o que são esses termos?
Estrutura básica de um silogismo, com o argumento perfeito:
Premissa 1: Todos os homens são mortais.
Premissa 2: Sócrates é homem.
Conclusão: Logo, Sócrates é mortal.
As premissas são proposições, ou seja, devem necessariamente ser avaliadas como verdadeiras ou falsas. Toda premissa de um silogismo deve ser uma proposição:
“O céu é azul” (verdadeira ou falsa?)
“Quando chove molha o chão” (verdadeira ou falsa?)
“Todo homem é mortal” (verdadeira ou falsa?)
“2 + 2 = 5” (verdadeira ou falsa? Mesmo sendo falsa, ainda é uma proposição, pois pode ser validada.)
O que não pode ser uma premissa:
“Feche a porta!” (É uma ordem, não proposição)
“Seja feliz!” (É um desejo, não tem como avaliar a validade)
“Você vem sempre aqui?” (É uma pergunta, não serve como premissa)
“A maioria das pessoas acha que política é chata.” (Não serve bem como premissa se você não define “maioria”, “acha” ou “chata”.)
Termo menor: O termo menor é sempre o sujeito da conclusão.
Termo médio: termo que liga termo menor ao termo maior, sempre se encontra na primeira e segunda premissa, não na conclusão. Nesse caso, pelo fato de Sócrates ser homem, ele é mortal.
Termo maior: O termo maior é sempre o predicado da conclusão. Ou seja, tudo que é dito sobre o sujeito na conclusão do silogismo.
Deve ter 3 termos, como já explicado.
O termo médio nunca entra na conclusão, como já explicado, somente nas premissas 1 e 2.
O termo médio deve ser distribuído ao menos uma vez como total:
Premissa 1: Alguns políticos são honestos.
Premissa 2: João é político.
Conclusão: João é honesto.
*Errado: o termo médio: “político”, não foi considerado nenhuma vez no argumento como verdadeiro ou falso em sua totalidade. A premissa 1 deveria ser: “Todo político é honesto.” para que o argumento com sua conclusão de que "João é honesto" fosse estruturado corretamente. Mesmo que a premissa: “todo político é honesto” seja nitidamente falsa pela constatação da realidade, o silogismo estaria tecnicamente bem formulado.
Nenhum termo deve ser total na conclusão se não for em alguma das premissas:
Premissa: Alguns alunos são estudiosos.
Conclusão: Todos os estudiosos são alunos.
*Errado: “estudiosos” aparece na conclusão como um grupo total, mas nas premissas aparece apenas como “alguns”.
Premissa 1: Todos os gatos são seres vivos.
Premissa 2: Alguns animais são gatos.
Conclusão: Logo, Todos os animais são seres vivos.
*Errado: Apesar da conclusão ser verdadeira o silogismo é mal construído, pois as premissas não induzem à conclusão. Estamos afirmando algo sobre todos os animais na conclusão (termo distribuído/total), mas só falamos sobre alguns animais na premissa (não distribuído). Isso viola a regra.
O silogismo ficaria correto se ajustarmos a conclusão para “alguns”:
Premissa 1: Todos os gatos são seres vivos.
Premissa 2: Alguns animais são gatos.
Conclusão: Logo, alguns animais são seres vivos.
*Correto!
Não pode haver duas premissas negativas.
Não haverá conclusões lógicas possíveis de duas premissas negativas:
Premissa 1: Nenhum réptil é mamífero.
Premissa 2: Alguns peixes não são mamíferos.
Conclusão: ???
Não dá pra concluir nada sobre répteis e peixes, porque as duas premissas negam a ligação com “mamíferos”, mas não afirmam nenhuma ligação entre si.
Se uma das premissas for negativa, a conclusão deve ser negativa:
Premissa 1: Nenhum poeta é matemático. (premissa negativa)
Premissa 2: Alguns artistas são poetas. (premissa positiva)
Conclusão: Alguns artistas não são matemáticos. (conclusão negativa)
7. De duas premissas afirmativas não se conclui uma negativa:
Premissa 1: Quando chove, molha o chão (afirmativa)
Premissa 2: Acabou de chover (afirmativa)
Conclusão: O chão não molhou. (negativa)
Isso é uma falácia chamada negação do consequente: Se as duas premissas são afirmativas, deve-se ter uma conclusão também afirmativa, nesse caso seria: “O chão molhou”.
8. A conclusão sempre segue a premissa mais fraca (negativa e particulares)
Premissa 1: Nenhum filósofo é matemático. (E)
Premissa 2: Sócrates é filósofo. (A)
Conclusão: Sócrates não é matemático. (E)
Uma premissa negativa deve ter uma conclusão também negativa (segue a premissa mais fraca, nesse caso E → E).
Todas essas regras são bem intuitivas, ou ao menos, se tornam intuitivas com a prática. Mas afinal, como podemos usar esse método em nosso dia a dia?
Quem nunca viu aquele título sensacionalista de uma matéria de jornal ou de um vídeo no youtube e entrou para conferir, mas no final, a matéria não demonstra nada, ou às vezes até contradiz a proposição do título. Ou até mesmo, só de bater o olho, temos uma impressão quase certa de que aquele título não passa de sensacionalismo.
Falácia, segundo a Oxford Languages significa:
"qualquer enunciado ou raciocínio falso que entretanto simula a veracidade;"
Falácia é derivado da palavra "fallacia", do verbo "fallere" do latim, que significa literalmente "enganar". Trata-se de um argumento incoerente, falso em tentar provar aquilo que se alega.
título de uma matéria da superinteressante
Essa proposição das matérias supracitadas segue um silogismo implícito:
Premissa 1: Quem toma café vive mais.
Premissa 2: João toma café.
Premissa 3: Logo, João viverá mais.
O fato de João tomar café fará com que ele viva mais que Pedro que não toma? Se Pedro pratica esportes, não tem vícios, se alimenta melhor que João, ainda assim João viverá mais que Pedro?
Esse é um clássico argumento de falsa causalidade. O estudo pode ter encontrado uma correlação qualquer entre consumo de café e longevidade, mas há dezenas, ou até centenas de outros fatores que influenciam na longevidade.
É óbvio que um título não pode expressar a totalidade de um argumento, mesmo assim, os títulos acima apresentam a falácia da falsa causa/causalidade.
Alguém poderia viajar para a França e Inglaterra, por exemplo, voltar ao Brasil sair dizer:
“Os europeus são arrogantes!”
Você sabe intuitivamente, imagino, que dada a experiência de nosso amigo imaginário, essa frase expressada não condiz necessariamente com a realidade. Podemos formar um silogismo para saber se essa proposição faz algum sentido.
Sabemos que:
1. Ele viajou somente em 2 países da Europa.
2. Ele não conheceu:
a. Nem todas as pessoas dos países que ele viajou.
b. Muito menos todos os europeus.
3. Ele acha que os Europeus são arrogantes.
4. Ele provavelmente teve experiências ruins com os europeus que ele encontrou.
O silogismo ficaria assim:
Premissa 1: Conheci alguns europeus que foram arrogantes.
Premissa 2: Há europeus que demonstram arrogância.
Conclusão: Portanto, (todos) os europeus são arrogantes.
Isso também é uma clássica falácia da generalização precipitada, porque estaríamos julgando um grupo inteiro com base em apenas dois exemplos. Não dá pra concluir isso de forma justa sem uma amostra muito maior. Você pode achar, por exemplo, pessoas que tiveram ótimas experiências com europeus. Essa falácia é muito viciosa no método de raciocínio de muitos Brasileiros, talvez uma das mais comuns. Há uma frase que ouvi uma vez que dizia: “(Muitos) Brasileiros tem 2 neurônios, um do ‘eu sou contra’, e outro do ‘eu sou a favor’.” Portanto, precisamos entender que pode haver um universo entre uma coisa e outra.
Há também um clássico, que é muito usado em discursos e retóricas política:
"Se você não é a favor da lei X, então é contra o país (ou contra determinado grupo)".
Um lei que é muitíssimo debatida em épocas eleitoreiras, por exemplo, é a famosa lei de cotas. Muitas vezes, os grupos que defendem a lei dizem dos grupos que não defendem:
“Você não defende a lei de cotas, então você não quer o povo negro nas universidades.” - Ou algo semelhante.
Premissa 1: A lei de cotas facilita o acesso dos negros às universidades.
Premissa 2: Você é contra a lei de cotas.
Conclusão: Logo, você é contra negros na universidade.
Mas há uma clara falácia do falso dilema contida nessa lógica, que muitos, talvez pelo calor da discussão, ou pela paixão nos ideais, não percebem:
1. Há pessoas negras que são contra as leis de cotas.
2. Há outros tipos de ajuda que podem ser oferecidos para que os negros, ou outros grupos minoritários entrem nas universidades:
a. Apoiar políticas baseadas em critérios socioeconômicos.
b. Ser a favor da inclusão dos negros nas universidades, mas criticar a forma de implementação das cotas.
c. Ser a favor das cotas, mas uma lei de cotas diferente.
3. Uma pessoa que não defende tal lei, não necessariamente não gosta, ou não quer que tenham negros nas universidades.
Quando usa-se de falácias para defender ideias e ideais, é 99,99% certo, que, você cometerá injustiças para com os outros, e deixará de enxergar muito dos possíveis caminhos que há na sua frente.
"Horóscopo é verdadeiro porque muitas pessoas acreditam"
Silogismo implícito na frase:
Premissa 1: Muitas pessoas acreditam em horóscopo.
Premissa 2: Se muitas pessoas acreditam em algo, então é verdadeiro.
Conclusão: Horóscopo é verdadeiro.
A premissa 2 faz com que caiamos na falácia do apelo à multidão. A popularidade de uma crença não é evidência de sua veracidade. A verdade não depende do número de pessoas que acreditam nela. Sabemos que no mundo, nunca houve uma hegemonia total sobre crenças e visões de mundo, mas em certos grupos, sociedades e culturas houveram muitas teorias científicas e crenças que eram aceitas pela maioria de determinados grupos, mas que foram confirmadas falsas ao longo do tempo.
Quem nunca viu títulos de matérias de jornais com o famoso “...diz especialista” ao final? O Apelo à autoridade nem sempre pode ser desconsiderado, ao contrário de algumas outras falácias, pois, pode-se usar o apelo à autoridade para apoiar ou embasar seu argumento que já é bem estruturado. É muito comum no meio acadêmico por exemplo, pelo vício enciclopedista, que quase tudo que se diz, seja embasado por algum outro especialista da área. À depender do assunto e o tipo de acesso que o assunto necessite, você precisará ter o amparo do apelo à autoridade.
Se você quer embasar um argumento que precise de um suporte de algum tipo de pesquisa de laboratório, por exemplo, ou algum tipo de estudo de anos, revisado por pares, ou coisas que você não consegue ter fazer por si, pesquisar e experimentar. É preciso que seu argumento esteja logicamente bem estruturado e que você “apele à autoridade” das pessoas que fizeram os testes e/ou estudos que você não conseguiria fazer.
Porém, o apelo à autoridade pode ser uma falácia quando se tem outros pontos de vista, que também são bem embasados por outras autoridades no assunto em discussão. O ato de confiar 100% em uma autoridade reconhecida em um assunto, faz com que você acometa em raciocínio vicioso, e portanto, caia na falácia.
Por exemplo:
Premissa 1: O especialista X afirmou que o produto Y é bom.
Premissa 2: Especialistas são sempre confiáveis. (Premissa nem sempre explícita dentro da falácia)
Conclusão: O produto Y é bom.
Portanto, a veracidade de uma afirmação não depende apenas da autoridade de quem a faz. Mesmo especialistas podem errar ou ter opiniões divergentes entre si.
Não poderia deixar de falar do clássico “ad hominem”. Ad hominem, também usado muito em debates na savana política, discussões de relacionamento e afins. É a falácia que ataca a pessoa ao invés de atacar a ideia ou argumento que ela propõe.
“Acho que o país deveria investir mais na educação básica do que na educação superior, porque ... (argumentos)”
“Mas, por acaso, o que você sabe sobre educação? Você é formado em alguma coisa? Já trabalhou em algum órgão público pra saber de algo? Quem é você? ... (ad hominem)
Esse pode ser um bom exemplo de Ad hominem, o opositor não está muito preocupado no conteúdo da crítica ou argumento, mas sim em desqualificar quem emitiu o argumento, para que, digamos… ganhar no grito.
“Amor, não acha que você está comendo demais?”
“O que você tá falando? Vê se é eu que fica saindo para comer e beber com os amigos, e fica assistindo aquele jogo comendo biscoito e tomando refrigerante!” ... (ad hominem)
“Fulano, acho que você não deveria fazer isso...”
“Ahh, você querendo me dar conselhos? Logo você que fez isso e aquilo aquele dia; pelo amor né!? ... (ad hominem)
Esses são alguns exemplos do famoso “argumentum ad hominem” (ataque pessoal), o último exemplo pode ser exemplificado em silogismo da seguinte maneira:
Premissa 1: Pessoas que erraram no passado não podem corrigir os outros. (essa pode estar oculta em uma discussão)
Premissa 2: Você errou semana passada.
Conclusão: Você não pode me corrigir agora.
A crítica ao passado da pessoa é usada para evitar responder ao argumento atual, que pode ser válido. Não é por que alguém comete ou cometeu certos erros, que tudo que esse alguém fala ou faz, deve ser desqualificado.
Se te for pedido, para que faça um algoritmo, não precisa ser com nenhum linguagem de programação específica, e sim determinados passos para que um problema seja resolvido, como:
Fazer um algoritmo para calcular 10% de desconto para toda a compra que for igual ou maior que R$230,00.
Para facilitar a resolução do problema, podemos estruturar isso em um silogismo básico:
Premissa 1: Toda compra com valor igual ou superior a R$230,00 recebe 10% de desconto.
Premissa 2: Esta compra tem valor de R$X (variável que será verificada).
Conclusão: Se X ≥ 230, aplica-se 10% de desconto; senão, o valor permanece o mesmo da compra.
A partir daí podemos começar a elaborar nossas variáveis e funções. Quando pensamos com o uso de silogismos o pensamento se torna mais claro, mais vívido. Faça esse exercício: Pegue um problema do seu trabalho ou do dia a dia, alguma afirmação duvidosa que alguém fez para você, ou que você viu em alguma notícia e tente transformar em silogismo, descubra o sujeito, predicado, termo menor, médio e maior e veja se aquilo faz sentido logicamente, ou contém uma ou mais falácias.
refs:
[1] Silogismo
Veja também: Como estudar e aprender